quinta-feira, 31 de maio de 2012

Ponte para a vida de verdade

Com a semana quase, quase a acabar aqui pela vida nortenha, tenho tentado que cada dia seja o mais diferente possível, podendo visitar e conhecer as coisas mais diferentes e interessantes possíveis. Nem sempre é possível sair de cada a toda a hora, porque tenho muita coisa a fazer do projecto, mas bom, há tempo para tudo.

Hoje foi dia de visitar a Escola da Ponte, na Vila das Aves, a caminho de Guimarães! (ver mais em:  http://beta.escoladaponte.com.pt/) Ando para visitar esta escola, desde uma Pós-Graduação em Psicopedagogia Clínica que fiz, há mais de 11 anos. As minhas professoras brasileiras falaram-me pela primeira vez nesta escola, que é a primeira escola do mundo com um projecto "alternativo" dentro de uma escola oficial. Depois de tanto tempo a querer visitá-la, achei que era agora a altura certa: visitar a escola e apresentar o meu projecto aos alunos, com a finalidade ser avaliada por eles, de forma crítica e enriquecedora.

E porque é esta escola "alternativa"?
"Não existem salas de aulas, no sentido tradicional, mas sim espaços de trabalho, onde são disponibilizados diversos recursos, como: livros, dicionários, internet, vídeos... ou seja, várias fontes de conhecimento. Este projecto, assente em valores como a Solidariedade e Democraticidade, (...) promovem uma autonomia responsável e solidária." A bem dizer parece algo esquisito...

Se me dissessem que havia por aí uma escola sem salas de aulas tradicionais, sem professores a dar aulas, sem campaínha, sem livros escolares por aluno, sem testes de avaliação. Uma escola onde os alunos "gerem" a escola, onde os alunos decidem as regras da escola, onde os alunos tratam os "professores" por amigo e não por "senhor professor", onde os alunos estão todos nas mesmas salas independentemente do ano, onde efectivamente não há anos escolares, onde alunos-pais-professores todos juntos é que decidem a retenção de um aluno num ano, eu no mínimo diria: "Isso não é uma escola é um recreio". Pois não é!

Ali, escolhe-se no início do ano, os 4 colegas de equipa para trabalhar ao longo do ano, tendo em conta, que os grupos devem ser heterógeneos, para que alunos com mais e menos dificuldades possam estar num mesmo grupo a ajudarem-se mutuamente. Os alunos escolhem a sua equipa já pensando nisso: em ter alunos mistos dependendo da facilidade de aprendizagem ou das necessidades de cada um.

Ali, primeiro estuda-se sozinho na mesa do grupo de 4, depois pede-se ajuda aos colegas, se os colegas não souberem, pede-se ajuda aos "professores" e se houver a mesma dúvida por muitos alunos, o "professor" então explica para todos.

Ali, os "professores" não são "professores". Eles são tutores, eles orientam, não direccionam ou condicionam a aprendizagem dos alunos, porque cada aluno escolhe o seu processo educativo.

Ali, os alunos escolhem os seus directores de turma!

Ali, não há campaínhas, porque os alunos sabem os horários e quando chega a hora da entrada, um aluno diz: "Pessoal, está na hora." E rapidamente o recreio fica vazio e está tudo dentro das salas de aula. (E ninguém me contou, eu vi.)

Ali, os alunos têm objectivos a atingir dispostos na parede que gerem por quinzena, estudando e preparando-se para os momentos avaliativos, escolhidos pelos próprios: um trabalho, uma apresentação, um teste, uma oral, etc.

Ali, os alunos fazem listas eleitorais no início do ano, escolhem os elementos da Assembleia, que é constituído por alunos de todos os anos. Fazem-se assembleias todas as 6as feiras, de 1h15 minutos, no espaço da Junta de Freguesia, depois de cada aluno ter informado ao longo da semana, quais os assuntos a abordar. Na Assembleia, decide-se entre todos, as conclusões e as directrizes a tomar.

Ali, na primeira Assembleia do ano, os alunos revêm os direitos e deveres de toda a escola, bem como o dos visitantes da mesma. E durante o ano, são eles os responsáveis pelo cumprimento dessas regras. Se por exemplo, alguém deita um papel para o chão, todos têm o direito de chamar a atenção a pessoa em causa, para que o papel encontre o local adequado.

Ali, ninguém leva disfarce de Carnaval de casa, porque há alunos ricos e outros pobres e na escola todos são iguais. Então, todos fazem os seus disfarces e aprendem com isso. Se quiserem ir de visita de estudo, fazem actividades de angariação de fundos e só em último caso, as famílias que querem, contribuem com o dinheiro que faltar para o grupo todo. Senão houver dinheiro para um, ninguém vai!

Ali, ninguém leva mochilas carregadas com livros, estojos e cadernos. Ali, a escola disponibiliza o material, que está na sala, que é de todos. Os livros são de todos, estão na sala, mas também podem ser requisitados para irem para casa dos alunos, se o aluno achar que necessita de fazer T.P.C.'s. Logo, os T.P.C.'s são propostos pelo próprio aluno, consoante achar que tem essa necessidade.

Ali, depois do horário das "aulas" acabar, às 16h15 fazem-se actividades de prolongamento, como xadrez, teatro, preparação do S. João, entre outras, apoiadas por um professor (à vez) ou por um pai que queira colaborar. Estas actividades finalizam às 18h, horário em que há pais que vão buscar os seus filhos à escola, pois é para isso que serve este prolongamento.

Ali, se os alunos decidem fazer natação ou outra modalidade desportiva fora da escola, vão todos a pé, mais de 20 minutos, pois não há transporte para os deslocar até à piscina ou ao ginásio... e vão felizes, muito felizes, porque foram eles que decidiram a necessidade da actividade e por isso, dão valor independentemente de irem 20 minutos a pé, à torreira do sol.

Ali, as visitas são sempre bem vindas, há mais de 20 e tal visitas semanais, de todas as partes do mundo e são os alunos que as guiam. Ali, o aluno que me guiou, disse que foi para aquela escola no 3.º ano, que antes não era uma criança muito sociável e que não sentia a escola como família. Quando ali chegou, sentiu que a escola era a sua segunda família, que os professores eram amigos e que cada criança podia aprender de forma individualizada. Podia evoluir ou demorar mais tempo a aprender e que a diferença das outras escolas, é que ali, os alunos não eram como os pés de gueixas, que são enrolados nos sapatos, para o pé não crescer... Ali, os alunos podem crescer ao seu jeito da forma do seu próprio pé! (E foi isto que ele me disse, hém?)

E pronto, muito... mas muito mais havia a dizer, mas olhem, vejam o vídeozito, sim? http://ww1.rtp.pt/play/?tvprog=25323&idpod=36549

Será que um dia podemos ter uma sociedade TODA assim? ;) Eu já me contentava com o Troco 1 hora assim! :)

6 comentários:

  1. Espectacular, não sabia disto!
    Também concordo, as escolas deviam ser todas assim.
    Mas vai ser assim, nem que a vaca tussa!

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    1. Ou vai... ou racha!!!! :) E depois das escolas, que seja a sociedade! Que seja vida! *

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  2. Quero ver esses miúdos a fazerem exames de acesso ao ensino superior... :-/
    É tudo muito fantástico, mas não passa disso mesmo, do reino do fantástico!...

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    1. A escola vai só até ao 9.º ano e sim, pelo que me informaram há algum tempo têm óptimos resultados. Até porque se formos a ver, os exames, mais do que "testar" conteúdos, testam raciocínio e a Escola da Ponte é isso que faz. Prepara-os para o raciocínio crítico e para a vida... A mim, a única coisa que acho que é "desvantagem" é estes alunos (futuros cidadãos conscientes) terem de se adaptar a partir do 10.º ano a uma sociedade inconsciente... mas isso, já é outra conversa!!! ;)

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  3. Por acaso, caro anónimo, tanto quanto sei, têm-se distinguido nas notas ao nível nacional. Mas não é bem disso que estamos aqui a falar: quanto vale um cidadão consciente, proativo, envolvido, responsável e autónomo?

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    1. É isso mesmo... mas que deve ser frustante um cidadão consciente, proativo, envolvido, responsável e autónomo adaptar-se depois a uma sociedade com características diferentes... isso deve!!!! :(

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